A morte estúpida (por espancamento) do congolês Moise Kabagambe, num quiosque do Rio de Janeiro, traz de volta um tema que precisa ser mais debatido na sociedade, a partir das escolas, universidades, igrejas e outras instituições ligadas a vida: a banalização da violência.
Em pertinente texto sobre o assunto (“A banalização da violência e o espetáculo do crime”), o advogado criminalista Renato Cardoso de Almeida Andrade, ex-juiz membro do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná, lembra que cada vez mais somos espectadores apáticos e distantes do palco feroz de um segmento marginal cada dia crescente em todas as cidades do Brasil. As estatísticas sobre isto são irrefutáveis.
“A cada um de nós é constantemente mais difícil citar e recordar qual o crime gravíssimo foi praticado ontem, na última semana ou no mês passado. O que nos agride é aquele crime bárbaro do qual tomamos conhecimento há apenas alguns minutos”, destaca.
Para o Dr. Renato Cardoso, a banalização da violência e a dramatização do crime têm contribuído de maneira decisiva para que o poder de reação seja cada vez menor, tanto por parte dos cidadãos de bem como pelo ineficiente Estado, que só faz ouvir os discursos fáceis a propósito da política de segurança pública.
Perguntas essenciais
Ainda do texto em menção e pensando apenas em algumas situações ocorridas nas últimas horas, em Mato Grosso, como o estupro filmado de uma jovem, por um motoqueiro que lhe deu carona, em Várzea Grande, é importante inquirir sobre quantos minutos cada um dos fatos de violência que predominam nos veículos de comunicação, dando-lhes ibope e rendendo altas parcerias, afetam nossas vidas? Qual a importância que cada um de nós efetivamente dá frente a mortes como a do trabalhador Durval Teófilo Filho, coincidentemente negro, alvejado ao chegar em casa, pelo vizinho, um sargento da marinha, que o teria confundido com um ladrão? Passados alguns minutos de indignação verdadeira, quantas pessoas deixam de lado seu jantar ou seus afazeres para refletir sobre o ato de violência brutal que acabou de assistir na televisão? “Sem medo de qualquer equívoco, posso afirmar que o percentual é absolutamente irrisório”, responde o criminalista.
Insensibilidade
“Absolutamente nada nos sensibiliza de modo convincente, provocando um distanciamento que constrói uma barreira, que evita uma reação exigível de cada cidadão individualmente ou grupo social coletivamente. Apenas aqueles que são atingidos pessoal e dolorosamente pelos atos de violência é que se reúnem em ONGs apelando pela paz. Gritos que são ouvidos por pouco tempo e olimpicamente desprezados pelos administradores públicos, responsáveis pela política e efetivação da segurança pública”, continua (...) “Chegamos, agora, a tal ponto de desvalorização do Homem que se mata sem razão alguma, apenas pelo simples prazer de matar”.
O papel do Estado
Na busca de uma solução, Renato Cardoso destaca o papel do Estado, que tem a responsabilidade de combater a violência e a criminalidade, assim como tem o dever de oferecer aos cidadãos um ambiente de harmonia e paz social, garantindo-lhes a segurança pública elementar. “Para isso, basta que os Estados sejam eficazes. A eficiência dos atos da Administração Pública, refletida em resultados palpáveis e não espetaculares, é a resposta que se pode obter (e exigir) de administrações responsáveis e éticas. É na eficiência do Estado que poderemos focar o combate à nova criminalidade, pouco importando em que polo da ação ou omissão ele pode se acomodar”