“A gente nunca imaginou que pouco tempo depois, ele viria a ser sepultado no Cemitério Bom Jesus, é algo inexplicável!”. O relato, em tom de lamento, é de um dos familiares de Arrival Gonçalves Rios, que esteve com ele procurando espaço para o sepultamento do cunhado deste, Henrique Pereira Sobrinho, o Tiricão. Pouco tempo depois, Arrival seria sepultado.
Aos poucos, país afora, tem se multiplicado as histórias de pessoas de um mesmo núcleo familiar vindo a óbito, em decorrência da COVID 19. Um desses dramas aconteceu em Fortaleza, Ceará, onde o acadêmico de direito Samuel de Souza, de 24 anos, perdeu seis pessoas da família, para o vírus, num intervalo de 45 dias. As seis vítimas residiam no Bairro Mangabeira, na região Metropolitana da capital cearense.
Em Castanheira o ano de 2021 contabiliza histórias semelhantes envolvendo pelo menos quatro núcleos familiares de pioneiros no município. No caso de Arrival, a esposa Aldecy perdeu no espaço de menos de um mês, além do esposo, que faleceu no dia 21 de abril, o filho, Jadiel Rios, no dia 23 do mesmo mês, ou seja, num espaço de dois dias, e o irmão, Henrique, no dia 22 de março.
Aldecy é da família Vargens e no seio desta família pelo menos a partir de nove lares a história de três perdas irreparáveis serão contadas às futuras gerações. Além da própria Aldecy, tomemos como exemplo Maria Tigre Vargens Souza. Como outros sete irmãos, ela perdeu o irmão Henrique, o sobrinho, Jadiel, e o cunhado, Arrival. Os filhos desses, perderam tios e primo.
O mesmo quadro de tristeza prevalece nos remanescentes do casal José Francisco do Nascimento e Beatriz Joaquim do Nascimento. Pioneiros na cidade e entre os batistas, morreram no intervalo de três dias. Ela, no dia 7 de março. Ele, no dia 10. Neste caso, alguém lembrou o fato de que os dois eram inseparáveis, sendo um bom exemplo dos significados do “unidos para sempre” e do “até que a morte os separem!”.
Antes deles, nos dias 15 e 20 de fevereiro, num espaço de cinco dias, o vírus cruel, que exemplifica o lado democrático da experiência da morte – “leva a todos” -, vitimou outro casal, também muito querido pela comunidade. Deixaram a terra dos viventes, como se diz no gauchesco, Cinesia de Jesus Câmara Roldão e Salésio Roldão.
Esses exemplos fortalecem um conceito que se solidifica a cada dia, na medida em que o vírus da Covid 19 continua levando pessoas queridas, de forma inesperada: essa pandemia é extraordinariamente assustadora.
O ônus de qualquer descuido é muito pesado. E neste aspecto, não basta o cuidado de alguns. Qualquer descuido dos que ainda não levam a sério hábitos simples como intensificar a higiene das mãos e lavá-las constantemente, usar álcool em gel para higienizar as superfícies de contato, além das mãos utilizar lenço de papel ao espirrar e, principalmente, isolar-se socialmente para evitar o contágio e a sua propagação, pode ser fatal não apenas em relação a si, mas a esses outros, que se empenham em levar a sério as orientações de protocolo.
Não obstante, a irresponsabilidade de uns, que em alguns casos supera todos os limites em prejuízo do contágio de muitos, o grande desafio para que outras perdas não aconteçam é o de todos entenderem que não pode haver tolerância para o risco, pois o perigo não é nada menos que a morte!
Pensando nessas e outras pessoas – usamos como exemplo apenas algumas famílias que perderam mais de uma pessoa para o coronavírus – a pergunta de um clássico do rock é pertinente: “Quantas mortes serão necessárias pra se perceber que já morreu muita gente?”. A resposta passa pelo compromisso de cada um e das instituições, em fazer, de fato, a sua parte. Muito do que se pede não representa sacrifício algum. Mas, passa pela compreensão real do que verdadeiramente é o amor, que inclui, entre outras posturas, um olhar para além do próprio umbigo.