Covid-19: A solidão na morte

O corona vírus tem produzido vários cenários surreais. A solidão no antes e pós morte das vítimas é um bom exemplo. Uma cena, reproduzida na imprensa mundial, de pacientes recebendo tablets, na Itália, para se despedirem de seus familiares, via internet, dá tons fortes ao drama.

Em Mato Grosso, quatro pessoas viveram a experiência. Começou com o gerente de uma filial do Pascoalotto, em Lucas do Rio Verde. Luiz Nunes da Silva (Foto), de 54 anos, era um homem de muitos amigos, por conta de seu jeito solidário de ser. Falecido no dia 03 de março último, contudo, não teve velório e o caixão foi fechado até o sepultamento. Antes, viveu a dor de não poder receber um último abraço de seus próximos. 

Embora nem sempre os nomes sejam citados, os falecidos seguintes, um idoso de 82 anos, de Cáceres, um homem de 34 anos identificado como Silvano Rodrigues de Oliveira, que trabalhava em Aripuanã e foi sepultado em Juara e por último um idoso de Rondonópolis de 75 anos, tiveram em comum alguma forma de contato longe de suas realidades locais, um dos meios mais comuns de disseminação do vírus.

Para os vivos, além do sentimento doído das perdas, existe a sujeição a restrições severas nas despedidas, impossibilitando entre outas coisas o abraço, gesto que ameniza os efeitos devastadores da ruptura entre vida e morte. Talvez por conta desses cenários, as preces têm se multiplicado em todos os lugares e a fé nunca foi tão exercitada como nos últimos meses. 

Não fosse tudo isto, impossível não lamentar as tensões criadas no entorno do Covid-19, por conta do discurso político polarizado entre esquerda e direita, num momento em que a força da solidariedade e a luta pela vida deveria representar o objetivo maior de todos. Mas este detalhe soma-se a outros na construção de pelo menos uma interpretação possível: a de que o COVID 19 lança luz sobre problemas maiores, como a fragilidade da vida, a arrogância dos homens e a inutilidade de certos refúgios. 

Vivaldo S. Melo