Páscoa: A morte de Cristo e as nossas mortes

RESUMO DA NOTÍCIA

Com base na Carta do apóstolo Paulo aos Filipenses, capítulo 1º, versículo 21, uma pequena análise sobre as implicações da Páscoa em nossa vida.
Vivaldo S. Melo

Qual o assunto mais lembrado nesta semana? Acredito que um dos três acontecimentos mais importantes da história humana: a morte de Cristo. Os outros dois estão relacionados também a Ele, dando-lhe, por isto, o título de maior entre todos os personagens: seu nascimento, pois neste evento cumprem-se todas as profecias do Velho Testamento e a sua ressurreição, por dar garantia absoluta, aos que creem em sua mensagem, de vida eterna. 

As posturas dos primeiros cristãos diante da morte de Cristo e a morte, de uma forma geral, é a melhor referência que temos para a reflexão nestes dias em que muitos celebram a chamada Páscoa Cristã (existem muitos que rejeitam a data, atribuindo-a ao paganismo). Eles chegaram a compreensão real dos significados mais profundos envoltos naquele ato: Cristo veio para dar vida e vida em abundância, numa realidade presente, com fortes significados em todos os cenários da vida e da morte, e vida eterna nos céus, quando a vida por aqui cessar. O pecado, porém, era o problema. Daí o sacrifício vicário ser a única forma de tornar possível essa nova vida. 

O apóstolo Paulo ao compreender esses significados, em sua Carta aos Filipenses, escreve “para mim o viver é Cristo e o morrer é lucro”. Uso sua intepretação das duas realidades – a morte de Cristo e a resposta de seus seguidores a este evento, para algumas colocações essenciais:

 (i) Páscoa tem a ver com nova vida.  O conceito de viver “em Cristo” na teologia paulina nos faz lembrar muitas coisas. Uma delas relaciona-se ao modelo de vida definido nos ensinos de Cristo. Ele deve ser o molde daqueles que o concebem como Salvador e por esta compreensão se rendem a Ele, espontaneamente, como Senhor, aceitando uma vida submissa como uma forma de resposta sincera ao Seu amor, revelado, entre outras coisas, no ato de morrer pelos pecados do homem, se oferecendo como sacrifício perfeito a Deus, num ato que teve todo um sistema representativo no Velho Testamento, que já apontava para o momento histórico celebrado nesses dias. Viver em Cristo lembra uma ruptura com os padrões estabelecidos pelo mundo alienado de Deus, definidos, pelo próprio Paulo, como “velhas coisas” e a opção consciente por novos padrões, na forma de novos valores, nova ética, nova leitura da vida e da morte. Celebrar a Páscoa sem esse correspondente de vida é perder tempo. O ato da morte exige um ato de vida da parte dos que são capazes de dizer que seguem o Salvador e o tem como Senhor. Neste caso específico, o próprio termo sugere esta relação. 

(ii) A Páscoa, quando vista sob a ótica da morte do cordeiro, tem um sentido temporal. Pelo exposto, acima, é lucro para o cristão fazer morrer cada vez mais tudo aquilo que afronta a santidade de Deus. O apóstolo Paulo, nos seus escritos, registra de forma objetiva e clara, o que o cristão deve fazer morrer, num processo que implica em lutas contínuas entre o bem que precisamos fazer e o mal que precisamos evitar. A notícia ruim é que carregamos conosco, enquanto vivendo a realidade do aqui e do agora, os ímpetos da natureza pecaminosa que herdamos em Adão e não podemos, por nós, vencê-los. A boa, é que Deus, em Cristo, liberta-nos do poder de morte do pecado e disponibiliza os meios de graça para vencermos os instintos de nossa carne. A maior necessidade que temos neste processo, é buscarmos a plenitude do Espírito Santo. Este enchimento tem relação com ações permanentes de nossa parte  (uso dos meios de graça) como a leitura bíblica, a vida de oração, a comunhão com os da comunidade da fé, etc. O assunto é vasto, mas, em síntese, e colocando as coisas de uma forma bem simples de compreender, morrer para as coisas alheias a Deus, na medida em que caminhamos, sempre é lucro, pois os benefícios deste empenho (busca por santidade) são maravilhosos. A lista é enorme: alegria, paz, felicidade, prosperidade (não no sentido material), etc. 

(iii) A Páscoa, quando interpretada sob a ótica da morte do cordeio, tem um sentido atemporal, ou seja, além do tempo. Para os que concebem a existência de Deus e acreditam que aquilo que Ele faz em Cristo é fundamental, a morte se torna um lucro, porque ela não significa o fim a existência. A mensagem da cruz, quando recebida e crida, aponta para a eternidade. A ressurreição de Cristo, que será lembrada por muitos, no espírito da Páscoa, neste domingo,  é a prova final de que tudo não termina por aqui. A vida segue. O aqui e o agora representam um cenário transitório, onde as marcas do pecado muitas vezes torna o caminhar difícil para os que se propõem a amar a Deus acima de todas as coisas. As promessas de um por vir, sem quaisquer marcas do que há de mal no tempo que se chama hoje, contudo, anima o cristão e o motiva a perseverar. Quem morre tendo vivido à luz do evangelho, lucra neste sentido. Vai para algo melhor, grandioso e incomparável. Este tem sido o nosso consolo neste tempo de tantas perdas. E essa foi a razão dos primeiros cristãos não considerarem perda a morte por Cristo, como aconteceu com o próprio Paulo, autor da expressão básica para esta reflexão. 

Concluindo, perceberam por que usei o termo “nossas mortes”? A propósito da celebração da Páscoa, nesses dias, este pequeno texto paulino (o viver é Cristo e o morrer é lucro) tem muito mais de seu significado do que podemos imaginar. Dele entendemos que, ao compreender a mensagem da cruz, o cristão se dispõe a viver para Cristo, fazendo morrer,  por amor, dia após dia, os ímpetos de sua natureza pecaminosa. Também vê a morte física sob outra ótica: ela é a porta de entrada para a eternidade. Nos dois sentidos, portanto, é lucro. Qualquer celebração sem essas referências e vivências é vã.